Por Dimas de Fonte Silva
Certo dia numa nessas andanças que a vida corrida de professor me impõe, dois fatos chamaram a minha atenção: A primeira, um homem que vendia o que ele mesmo chamava de “pensamentos, poesias e orações para todas as horas” com preços variáveis ou ainda um CD, também gravado por ele, com o mesmo conteúdo, acompanhadas de um fundo musical, tudo isso dentro de um ônibus em direção ao Méier. Pareceu-me uma situação emblemática nessa sociedade bizarra em que vivemos.
Um autor tenta propagandear sua obra a possíveis compradores que em sua maioria não estavam nem um pouco interessados em consumir algo tão abstrato e completamente desconectado, não só de suas necessidades imediatas, como também de uma sociedade que não privilegia em nada a formação, e por extensão os formadores de conhecimento.
O que nos leva ao segundo fato que me chamou a atenção ao remexer em velhos papéis em busca de material para preparar uma aula. Tenho a mania de colecionar pensamentos e reflexões sobre a vida que eu acho interessantes e sem querer me deparei com esse que tinha uma reflexão de uma articulista do Jornal O Globo que me chamou tanto a atenção que eu guardei e esqueci, é um daqueles raros e luminosos momentos em que alguém descreve com poucas linhas algo que você sempre pensou. Disse ela sobre a sociedade:
“Cada vez mais as famílias abdicam do papel na educação dos filhos - seja por falta de tempo, falta de paciência ou pura falta consciência. Quando se fala das camadas mais pobres, então, e de quem mais precisa de educação, sequer há famílias na equação há mães adolescentes, cujas mães e avós as tiveram adolescentes, numa triste sucessão de vidas desperdiçadas.
A verdade é que há mais forças contra a escola, atualmente, do que a favor - a começar pelo presidente, que ostenta a sua ignorância na lapela, como motivo de orgulho. Estudar envolve uma cota de disciplina e de perseverança que antigamente se justificava pela perspectiva de um bom emprego e de um lugar respeitável na sociedade; mas tudo isso saiu de moda.
No mundo da gratificação instantânea, disciplina e perseverança são para otários. ídolos da garotada são traficantes, Big Brothers, jogadores de futebol, celebridades em geral; ninguém precisa de diploma se tiver manha, o corpo e os holofotes da mídia. Cérebro é opcional”.
Cora Rónai – Segundo caderno – O Globo – 31/08/2006.
Cérebro não é opcional. É item de série. Mas utilizá-lo não é algo que se nasce sabendo. Um grande mestre zen, disse certa vez: “O homem nasce biológico (porque tem um corpo), psicológico (porque tem uma mente), mas lógico ele tem que aprender a ser” e isso é trabalho para uma vida inteira, e ás vezes não é o bastante.
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